Livros didáticos frequentemente propagam a falácia de que a catequese destruiu a cultura indígena no Brasil. Esta coluna busca desmontá-la.
Livros didáticos frequentemente propagam a falácia de que a catequese destruiu a cultura indígena no Brasil. Esta coluna busca desmontá-la.
“A Companhia de Jesus veio ao Brasil, enviada pelo Rei, com esta finalidade específica: a conversão dos índios, obrigação primeira da Coroa. (L.Palacin, o.c., p.110)”1
Pelo menos desde o final do século XX, todos nós ouvimos, de maneira recorrente, a tese de que o Brasil não teria sido descoberto e sim invadido. Na esteira à essa ideia, encontra-se outra: aquela que diz que se o Brasil não tivesse sido colonizado por portugueses e catequizado por católicos, o país estaria em situação melhor hoje. Certamente, você já ouviu por aí que o ensino da religião cristã teria sido uma violência cultural feita aos indígenas pelos colonizadores e pelos missionários jesuítas que aqui chegaram no início de nossa colonização. Não é difícil encontrar em livros didáticos da educação básica a (des)informação de que a catequese teria destruído a cultura indígena. Esta coluna dedica-se a contribuir com o desmonte de mais uma falácia atribuída a Igreja Católica no Brasil.
De primeira, é importante saber que as acusações sofridas pela Igreja nessa temática estão ancoradas no que chamamos de “mito do bom selvagem”, uma ideia filosófica e literária que surgiu no século XVII e foi amplamente associada ao filósofo iluminista Jean-Jacques Rousseau. Embora o termo “bom selvagem” não tenha sido criado por Rousseau, suas ideias popularizaram a visão de que o homem em seu estado natural era puro e livre, enquanto a civilização trazia desigualdade, opressão e degradação moral.
Hoje, são vários os estudiosos que se dedicam a desconstruir tal mito, considerando que ele reduz culturas inteiras a uma visão romantizada, ignorando sua diversidade e complexidade. Ele desconsidera que essas sociedades também enfrentavam problemas como violência, rivalidades e práticas questionáveis do ponto de vista ocidental. Esse conceito idealiza os povos indígenas e outras populações “não civilizadas” como seres naturalmente puros, bondosos e em harmonia com a natureza, em contraste com a corrupção e os vícios atribuídos à sociedade européia da época. De acordo com esse mito,
(…) os habitantes da América constituíam, antes do seu contato com os europeus, civilizações perfeitas e imaculadas, como se os seus integrantes não tivessem sido contaminados pelo mesmo pecado original de que padecemos todos nós, filhos de Adão e Eva.2
O mito do bom selvagem, antes de qualquer coisa, é uma “fantasia colonial” – para lembrar Stuart Hall – que intelectuais progressistas do Ocidente gostam de manter sobre as sociedades periféricas, apreciando apenas os nativos “puros” e os lugares exóticos “intocados”. Tal mito também aparece entre outros grupos populacionais considerados minoritários, como os negros africanos:
“Mama África”, por sua vez, é uma fantasia compensatória de pretos ocidentais, quando sintomaticamente de costas para a realidade cruel da exploração do negro pelo negro no continente africano, com multidões famintas em Angola, por exemplo, ou para a vida religiosa em grande parte da Nigéria, que nada tem de “candomblezeira”, sendo, antes, claramente dividida entre a metade muçulmana e a metade cristã da população do país. (…) A África da militância neonegra do Ocidente é uma África folclórica. Uma construção ingênua e desinformada. Mera ficção.3
É importante ressaltar o óbvio (Chesterton já tinha nos avisado que chegaria o dia em que precisaríamos provar que a grama é verde): o mito do bom selvagem representa uma inverdade histórica. Na afoiteza de denunciar a violência do agressor, intelectuais e ativistas passaram a conceber a plena inocência do agredido, como se a história fosse uma novela em que há, apenas, vilões e mocinhos. Todos os homens padecem de misérias e limitações comuns à humanidade no geral. Nenhuma civilização resguarda o paraíso terrestre como faz parecer a narrativa que coloca brancos e europeus como invasores e, indígenas e africanos como invadidos. Essa narrativa carece tanto de precisão histórica que mereceria ser incluída no rol da literatura ficcional, pois às ciências sociais não deveria pertencer. Apesar de parecer enaltecer os povos considerados minoritários ou periféricos, o mito os apresenta sob uma lente bastante eurocêntrica, ignorando sua agência e autonomia.
Aqui cabe um exemplo: os astecas, considerados a civilização mais avançada do continente americano entre os séculos XIV e XVI, utilizavam prisioneiros para os seus rituais de sacrifícios humanos, e por isso consideravam a guerra como um dever sagrado. Para a inauguração do Templo Mayor no México, cerca de 80 mil pessoas4 foram sacrificadas por indígenas mexicanos5. Ou seja, trata-se de um genocídio indígena perpetrado por indígenas, antes da chegada dos colonizadores espanhóis liderados por Hernán Cortés.
No Brasil, Frei Vicente do Salvador6 relata o costume de diversas tribos de abandonar os doentes de enfermidade prolongada e incurável para que morressem sozinhos.7 Ele conta também que os tapuias “são inimigos uns dos outros” e bastante belicosos. O famoso explorador alemão Hans Staden conta que, por volta de 1540, passou três anos entre os tamoios de Ubatuba, sempre na iminência de ser devorado. Conta, ainda, que os prisioneiros costumavam ser torturados com crueldade antes de serem mortos nas tribos.8
Renomados indianistas não hesitam em afirmar que, além das doenças, a grande causa da extinção de muitos grupos indígenas foram as guerras intertribais, intensificadas e agravadas pelo conhecimento do metal e das armas de fogo. Os tupinambás davam mulheres de presente aos prisioneiros que iam ser mortos e depois, além de matarem e comerem o prisioneiro, matavam e comiam os filhos nascidos dessa união.9 No Alto Xingu, algumas tribos desapareceram totalmente em consequência das guerras com grupos vizinhos, restando delas apenas os nomes. Quer dizer, como entre todos os homens, havia também entre os indígenas quem fosse desumano, violento e brutal; a realidade indígena estava bem distante da visão paradisíaca do bom selvagem.
Com honestidade intelectual, não é possível compreender o contexto apresentado anteriormente como equivalente ou superior às sociedades cristãs. Os próprios indígenas não parecem considerar a adesão ao cristianismo como genocídio cultural, uma vez que a fé cristã traz a promessa da vida eterna, a verdade e a paz. Aliás, os principais aliados dos missionários jesuítas foram os próprios indígenas!
Os missionários jesuítas foram enviados pela Companhia de Jesus, uma ordem religiosa católica fundada por Santo Inácio de Loyola em 1540, com o objetivo de evangelizar os povos indígenas e apoiar a expansão da fé cristã nas colônias portuguesas:
A descoberta apresentou um desafio à consciência cristã da Europa. O Papa Alexandre VI (1492-1503), na sua bula Inter caetera, bem como nas instruções dos Reis Católicos a Cristóvão Colombo, urgiam a evangelização dos nativos, mas também expressaram a preocupação de que a emigração do europeu para a América fosse feita por meio de “homens íntegros e tementes de Deus”. A grande preocupação dos reis católicos é que aqueles índios “tão dispostos a converter-se à nossa fé católica, visto que não eram viciados por seitas e heresias” fossem tratados, com muito amor e zelo apostólico.10
Assim como católicos de todos os tempos, os jesuítas acreditavam que todos os homens têm a dignidade essencial de filhos de Deus e, portanto, têm o direito essencial de conhecer a Verdade. A missão dos jesuítas no Brasil não estava aliada, portanto, ao colonialismo português, mas ao plano da fé sobrenatural, conforme previsto na própria Igreja: preparar, neste mundo, os homens para a bem-aventurança eterna.11
Padre José de Anchieta, missionário jesuíta, foi uma figura central na evangelização dos povos indígenas do Brasil durante o período colonial. Ele buscava transmitir os ensinamentos católicos de forma adaptada à realidade cultural dos indígenas, ensinando-lhes orações, cânticos e práticas religiosas. Mesmo num cenário adverso marcado por conflitos intertribais, Anchieta jamais considerou os indígenas sem benevolência:
Quantas vezes louva Anchieta a espontaneidade de tribos, como os Tupis de São Paulo, que “voluntariamente sem medo de ninguém porque ainda agora aquela gente está intacta, sem sentirem as tiranias dos portugueses, vivem como cristãos correspondendo plenamente ao esforço de seus catequistas.”12
Anchieta falando dos índios aldeados, diz que “muitos são capazes do Santíssimo Sacramento que recebem com muita devoção. E quanto à vida dos índios excede a maior parte dos portugueses do Brasil, porque muitos menos pecados cometem que eles.” (Cartas jes. III, 324)13
Anchieta defendia os direitos dos povos nativos contra os abusos de colonos portugueses, que frequentemente tentavam escravizá-los. Ele via os indígenas como almas a serem salvas e acreditava na importância de protegê-los:
Os contatos dos padres com o gentio irascível, inativo, lasso, carcomido, mísero, resistente, invulnerável, desabrido, lembram a atitude do pai tolerante que se curva sobre a cabeça do filho adolescente e a acaricia com brandura, sem jamais esquecer que está em presença de um ente infantil. Este era o Brasil menino…14
Anchieta destacou-se por seu esforço em aprender a língua tupi, a mais falada na costa brasileira. Ele compilou o conhecimento linguístico em sua obra “Arte de Gramática da Língua Mais Falada na Costa do Brasil” (1595), que ajudou outros missionários a se comunicarem com os povos nativos. Participou da fundação de escolas e aldeias missionárias, como a Vila de São Paulo de Piratininga (atual cidade de São Paulo), em 1554. Essas instituições serviram como centros de catequese e ensino, onde os indígenas aprenderam a língua portuguesa, práticas agrícolas europeias e a doutrina cristã.
Em 1759, os jesuítas foram expulsos do Brasil e de outros territórios portugueses por Marquês de Pombal, que os acusou de acumular poder e riqueza excessivos e de se oporem às políticas de exploração colonial e à escravidão indígena. Após a expulsão, muitas aldeias missionárias foram abandonadas ou destruídas, e os indígenas perderam uma de suas poucas formas de proteção frente à colonização.
A relação entre missionários jesuítas e indígenas no Brasil é um capítulo complexo. O que é possível perceber, contudo, que o cristianismo não foi aceito entre os indígenas por “imposição do colonizador”, como ouvimos comumente. A fé cristã foi aceita pela força de sua doutrina e pelo exemplo de santidade que os indígenas puderam testemunhar entre os missionários que aqui chegaram.
Pedagoga, Autora do livro “Mulheres que o feminismo não vê - Classe e Raça”. Realizou pós-doutoramento em Sociologia pela UFRJ.
“A Companhia de Jesus veio ao Brasil, enviada pelo Rei, com esta finalidade específica: a conversão dos índios, obrigação primeira da Coroa. (L.Palacin, o.c., p.110)”1
Pelo menos desde o final do século XX, todos nós ouvimos, de maneira recorrente, a tese de que o Brasil não teria sido descoberto e sim invadido. Na esteira à essa ideia, encontra-se outra: aquela que diz que se o Brasil não tivesse sido colonizado por portugueses e catequizado por católicos, o país estaria em situação melhor hoje. Certamente, você já ouviu por aí que o ensino da religião cristã teria sido uma violência cultural feita aos indígenas pelos colonizadores e pelos missionários jesuítas que aqui chegaram no início de nossa colonização. Não é difícil encontrar em livros didáticos da educação básica a (des)informação de que a catequese teria destruído a cultura indígena. Esta coluna dedica-se a contribuir com o desmonte de mais uma falácia atribuída a Igreja Católica no Brasil.
De primeira, é importante saber que as acusações sofridas pela Igreja nessa temática estão ancoradas no que chamamos de “mito do bom selvagem”, uma ideia filosófica e literária que surgiu no século XVII e foi amplamente associada ao filósofo iluminista Jean-Jacques Rousseau. Embora o termo “bom selvagem” não tenha sido criado por Rousseau, suas ideias popularizaram a visão de que o homem em seu estado natural era puro e livre, enquanto a civilização trazia desigualdade, opressão e degradação moral.
Hoje, são vários os estudiosos que se dedicam a desconstruir tal mito, considerando que ele reduz culturas inteiras a uma visão romantizada, ignorando sua diversidade e complexidade. Ele desconsidera que essas sociedades também enfrentavam problemas como violência, rivalidades e práticas questionáveis do ponto de vista ocidental. Esse conceito idealiza os povos indígenas e outras populações “não civilizadas” como seres naturalmente puros, bondosos e em harmonia com a natureza, em contraste com a corrupção e os vícios atribuídos à sociedade européia da época. De acordo com esse mito,
(…) os habitantes da América constituíam, antes do seu contato com os europeus, civilizações perfeitas e imaculadas, como se os seus integrantes não tivessem sido contaminados pelo mesmo pecado original de que padecemos todos nós, filhos de Adão e Eva.2
O mito do bom selvagem, antes de qualquer coisa, é uma “fantasia colonial” – para lembrar Stuart Hall – que intelectuais progressistas do Ocidente gostam de manter sobre as sociedades periféricas, apreciando apenas os nativos “puros” e os lugares exóticos “intocados”. Tal mito também aparece entre outros grupos populacionais considerados minoritários, como os negros africanos:
“Mama África”, por sua vez, é uma fantasia compensatória de pretos ocidentais, quando sintomaticamente de costas para a realidade cruel da exploração do negro pelo negro no continente africano, com multidões famintas em Angola, por exemplo, ou para a vida religiosa em grande parte da Nigéria, que nada tem de “candomblezeira”, sendo, antes, claramente dividida entre a metade muçulmana e a metade cristã da população do país. (…) A África da militância neonegra do Ocidente é uma África folclórica. Uma construção ingênua e desinformada. Mera ficção.3
É importante ressaltar o óbvio (Chesterton já tinha nos avisado que chegaria o dia em que precisaríamos provar que a grama é verde): o mito do bom selvagem representa uma inverdade histórica. Na afoiteza de denunciar a violência do agressor, intelectuais e ativistas passaram a conceber a plena inocência do agredido, como se a história fosse uma novela em que há, apenas, vilões e mocinhos. Todos os homens padecem de misérias e limitações comuns à humanidade no geral. Nenhuma civilização resguarda o paraíso terrestre como faz parecer a narrativa que coloca brancos e europeus como invasores e, indígenas e africanos como invadidos. Essa narrativa carece tanto de precisão histórica que mereceria ser incluída no rol da literatura ficcional, pois às ciências sociais não deveria pertencer. Apesar de parecer enaltecer os povos considerados minoritários ou periféricos, o mito os apresenta sob uma lente bastante eurocêntrica, ignorando sua agência e autonomia.
Aqui cabe um exemplo: os astecas, considerados a civilização mais avançada do continente americano entre os séculos XIV e XVI, utilizavam prisioneiros para os seus rituais de sacrifícios humanos, e por isso consideravam a guerra como um dever sagrado. Para a inauguração do Templo Mayor no México, cerca de 80 mil pessoas4 foram sacrificadas por indígenas mexicanos5. Ou seja, trata-se de um genocídio indígena perpetrado por indígenas, antes da chegada dos colonizadores espanhóis liderados por Hernán Cortés.
No Brasil, Frei Vicente do Salvador6 relata o costume de diversas tribos de abandonar os doentes de enfermidade prolongada e incurável para que morressem sozinhos.7 Ele conta também que os tapuias “são inimigos uns dos outros” e bastante belicosos. O famoso explorador alemão Hans Staden conta que, por volta de 1540, passou três anos entre os tamoios de Ubatuba, sempre na iminência de ser devorado. Conta, ainda, que os prisioneiros costumavam ser torturados com crueldade antes de serem mortos nas tribos.8
Renomados indianistas não hesitam em afirmar que, além das doenças, a grande causa da extinção de muitos grupos indígenas foram as guerras intertribais, intensificadas e agravadas pelo conhecimento do metal e das armas de fogo. Os tupinambás davam mulheres de presente aos prisioneiros que iam ser mortos e depois, além de matarem e comerem o prisioneiro, matavam e comiam os filhos nascidos dessa união.9 No Alto Xingu, algumas tribos desapareceram totalmente em consequência das guerras com grupos vizinhos, restando delas apenas os nomes. Quer dizer, como entre todos os homens, havia também entre os indígenas quem fosse desumano, violento e brutal; a realidade indígena estava bem distante da visão paradisíaca do bom selvagem.
Com honestidade intelectual, não é possível compreender o contexto apresentado anteriormente como equivalente ou superior às sociedades cristãs. Os próprios indígenas não parecem considerar a adesão ao cristianismo como genocídio cultural, uma vez que a fé cristã traz a promessa da vida eterna, a verdade e a paz. Aliás, os principais aliados dos missionários jesuítas foram os próprios indígenas!
Os missionários jesuítas foram enviados pela Companhia de Jesus, uma ordem religiosa católica fundada por Santo Inácio de Loyola em 1540, com o objetivo de evangelizar os povos indígenas e apoiar a expansão da fé cristã nas colônias portuguesas:
A descoberta apresentou um desafio à consciência cristã da Europa. O Papa Alexandre VI (1492-1503), na sua bula Inter caetera, bem como nas instruções dos Reis Católicos a Cristóvão Colombo, urgiam a evangelização dos nativos, mas também expressaram a preocupação de que a emigração do europeu para a América fosse feita por meio de “homens íntegros e tementes de Deus”. A grande preocupação dos reis católicos é que aqueles índios “tão dispostos a converter-se à nossa fé católica, visto que não eram viciados por seitas e heresias” fossem tratados, com muito amor e zelo apostólico.10
Assim como católicos de todos os tempos, os jesuítas acreditavam que todos os homens têm a dignidade essencial de filhos de Deus e, portanto, têm o direito essencial de conhecer a Verdade. A missão dos jesuítas no Brasil não estava aliada, portanto, ao colonialismo português, mas ao plano da fé sobrenatural, conforme previsto na própria Igreja: preparar, neste mundo, os homens para a bem-aventurança eterna.11
Padre José de Anchieta, missionário jesuíta, foi uma figura central na evangelização dos povos indígenas do Brasil durante o período colonial. Ele buscava transmitir os ensinamentos católicos de forma adaptada à realidade cultural dos indígenas, ensinando-lhes orações, cânticos e práticas religiosas. Mesmo num cenário adverso marcado por conflitos intertribais, Anchieta jamais considerou os indígenas sem benevolência:
Quantas vezes louva Anchieta a espontaneidade de tribos, como os Tupis de São Paulo, que “voluntariamente sem medo de ninguém porque ainda agora aquela gente está intacta, sem sentirem as tiranias dos portugueses, vivem como cristãos correspondendo plenamente ao esforço de seus catequistas.”12
Anchieta falando dos índios aldeados, diz que “muitos são capazes do Santíssimo Sacramento que recebem com muita devoção. E quanto à vida dos índios excede a maior parte dos portugueses do Brasil, porque muitos menos pecados cometem que eles.” (Cartas jes. III, 324)13
Anchieta defendia os direitos dos povos nativos contra os abusos de colonos portugueses, que frequentemente tentavam escravizá-los. Ele via os indígenas como almas a serem salvas e acreditava na importância de protegê-los:
Os contatos dos padres com o gentio irascível, inativo, lasso, carcomido, mísero, resistente, invulnerável, desabrido, lembram a atitude do pai tolerante que se curva sobre a cabeça do filho adolescente e a acaricia com brandura, sem jamais esquecer que está em presença de um ente infantil. Este era o Brasil menino…14
Anchieta destacou-se por seu esforço em aprender a língua tupi, a mais falada na costa brasileira. Ele compilou o conhecimento linguístico em sua obra “Arte de Gramática da Língua Mais Falada na Costa do Brasil” (1595), que ajudou outros missionários a se comunicarem com os povos nativos. Participou da fundação de escolas e aldeias missionárias, como a Vila de São Paulo de Piratininga (atual cidade de São Paulo), em 1554. Essas instituições serviram como centros de catequese e ensino, onde os indígenas aprenderam a língua portuguesa, práticas agrícolas europeias e a doutrina cristã.
Em 1759, os jesuítas foram expulsos do Brasil e de outros territórios portugueses por Marquês de Pombal, que os acusou de acumular poder e riqueza excessivos e de se oporem às políticas de exploração colonial e à escravidão indígena. Após a expulsão, muitas aldeias missionárias foram abandonadas ou destruídas, e os indígenas perderam uma de suas poucas formas de proteção frente à colonização.
A relação entre missionários jesuítas e indígenas no Brasil é um capítulo complexo. O que é possível perceber, contudo, que o cristianismo não foi aceito entre os indígenas por “imposição do colonizador”, como ouvimos comumente. A fé cristã foi aceita pela força de sua doutrina e pelo exemplo de santidade que os indígenas puderam testemunhar entre os missionários que aqui chegaram.