A amizade é um grande dom de Deus. E isso fica ainda mais claro quando se lê a Carta de Santo Agostinho a São Paulino de Nola. Confira!
A amizade é um grande dom de Deus. E isso fica ainda mais claro quando se lê a Carta de Santo Agostinho a São Paulino de Nola. Confira!
Ninguém chegou a pensar tanto sobre a amizade como Santo Agostinho, que faleceu no ano 430, aos 75 anos de idade. E isso pode ser em parte porque temos muitos de seus escritos, e suas opiniões devem ter evoluído durante sua vida. De fato, o estudioso J. T. Lienhard identifica uma progressão definitiva no pensamento de Santo Agostinho sobre o assunto. No início – recém saído de sua educação clássica – Santo Agostinho retomou as ideias de Cícero e quase literalmente, incluindo a definição de amizade de Cícero como “uma perfeita conformidade de opiniões sobre todos os assuntos religiosos e civis, unidos ao mais alto grau de estima e afeto mútuos”. Mas à medida que Santo Agostinho amadurece, ele começa a ver as complexidades do sujeito, e como elas escapam de Cícero. E, então, começa a ver uma nova fonte de amizade. Não é a concordância em assuntos religiosos e civis que faz amigos. É a graça que Deus nos dá que nos capacita a amar os outros e a fazer amigos. Isso significa que a única verdadeira amizade é a amizade cristã.
São Paulino de Nola era um senador rico que renunciou a tudo para levar uma vida ascética. Santo Agostinho e São Paulino tornaram-se grandes amigos por carta, embora nunca tivessem se conhecido. São Paulino pensava que um verdadeiro cristão poderia ficar contente em ter tal amizade espiritual, mas Santo Agostinho insistia que ver um amigo pessoalmente ainda era uma parte importante da amizade.
“Ó excelente homem e excelente irmão, houve um tempo em que tu estavas escondido para minha alma; e eu digo a ela para suportar pacientemente que não possa ver-te com meus olhos, mas ela quase – ou devo dizer completamente – se recusa a me obedecer.
Tu vais suportar isso com paciência? Se sim, por que então o anseio por tua presença atormenta minha alma mais íntima? Pois se eu estivesse sofrendo de enfermidades corporais, e elas não interrompessem a serenidade de minha alma, poderia eu dizer que as suportaria com paciência; mas quando não posso suportar com equanimidade a privação de não te ver, seria intolerável para mim chamar meu estado de ânimo de paciência.
Mas quando não posso tolerar silenciosamente não te ver, é intolerável chamar isso de tolerância. Sendo tu o que és, seria mais intolerável tolerar a tua falta. É bom, então, que eu não possa tolerar com uma alma tranquila aquilo que, se eu a tolerasse calmamente, não seria tolerável, e eu mesmo não suportaria como alma tranquila.
O que me aconteceu é estranho, mas é verdadeiro; lamento porque não te vejo, e a própria aflição me conforta; pois não admiro nem cobiço a coragem com que a ausência de uma pessoa boa, como tu, é suportada pacientemente. Não ansiamos pela Jerusalém celestial? E quanto mais impacientemente ansiamos por ela, não nos submetemos mais pacientemente a todas as coisas por causa disso? Quem pode se privar tanto da alegria de ver-te? Que não devemos lamentar quando tu não és mais visto? Eu, pelo menos, não posso fazer nem um nem o outro; e vendo que, é claro, se pudesse, seria apenas pisoteando sob os pés o sentimento certo e natural. Alegro-me por não poder fazer isso, e neste regozijo encontro algum consolo. Não é, portanto, a remoção, mas a contemplação desta dor que me consola.
Não me culpes, peço-te, com essa serenidade de espírito devota que tão eminentemente te distingue. Não digas que estou errado em me entristecer porque ainda não te conheço, quando revelaste à minha vista tua alma, teu homem interior. Pois se eu estivesse viajando em qualquer lugar, na cidade à qual tu pertences, e se eu tivesse vindo a conhecer-te como meu irmão e amigo, e como um cristão tão eminente como és, um homem tão nobre, como tu poderias pensar que não seria uma decepção para mim se eu não tivesse permissão para conhecer tua casa? Como, então, posso fazer agora senão lamentar que eu ainda não tenha visto teu rosto e tua figura, a morada daquela alma que eu vim a conhecer como minha própria alma?
Mas quando tu as ler, ó meu santo Paulino!, não deixe que as coisas que a Verdade disse por minha fraca instrumentalidade te arrastem a ponto de impedir-te de observar atentamente o que eu mesmo disse. Se tu beberes com ganância as coisas boas e verdadeiras que me foram dadas como ministro, não quero que te esqueças de rezar por meus erros e fraquezas. Em tudo o que vês, que justamente não gostas, estás vendo a mim mesmo; mas em tudo o que em meus livros aprovas, pelo dom do Espírito Santo que te foi dado, deves amar e louvar Aquele com quem está a fonte da vida, e em cuja luz veremos a luz, não às escuras como aqui, mas face a face 1.Quando releio meus escritos e descubro algo que se deve à ação do velho fermento em mim 2, culpo-me por isso com verdadeira dor; mas se algo do que eu disse vem, pelo dom de Deus, do pão ázimo da sinceridade e da verdade, regozijo-me com tremor.”
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Ninguém chegou a pensar tanto sobre a amizade como Santo Agostinho, que faleceu no ano 430, aos 75 anos de idade. E isso pode ser em parte porque temos muitos de seus escritos, e suas opiniões devem ter evoluído durante sua vida. De fato, o estudioso J. T. Lienhard identifica uma progressão definitiva no pensamento de Santo Agostinho sobre o assunto. No início – recém saído de sua educação clássica – Santo Agostinho retomou as ideias de Cícero e quase literalmente, incluindo a definição de amizade de Cícero como “uma perfeita conformidade de opiniões sobre todos os assuntos religiosos e civis, unidos ao mais alto grau de estima e afeto mútuos”. Mas à medida que Santo Agostinho amadurece, ele começa a ver as complexidades do sujeito, e como elas escapam de Cícero. E, então, começa a ver uma nova fonte de amizade. Não é a concordância em assuntos religiosos e civis que faz amigos. É a graça que Deus nos dá que nos capacita a amar os outros e a fazer amigos. Isso significa que a única verdadeira amizade é a amizade cristã.
São Paulino de Nola era um senador rico que renunciou a tudo para levar uma vida ascética. Santo Agostinho e São Paulino tornaram-se grandes amigos por carta, embora nunca tivessem se conhecido. São Paulino pensava que um verdadeiro cristão poderia ficar contente em ter tal amizade espiritual, mas Santo Agostinho insistia que ver um amigo pessoalmente ainda era uma parte importante da amizade.
“Ó excelente homem e excelente irmão, houve um tempo em que tu estavas escondido para minha alma; e eu digo a ela para suportar pacientemente que não possa ver-te com meus olhos, mas ela quase – ou devo dizer completamente – se recusa a me obedecer.
Tu vais suportar isso com paciência? Se sim, por que então o anseio por tua presença atormenta minha alma mais íntima? Pois se eu estivesse sofrendo de enfermidades corporais, e elas não interrompessem a serenidade de minha alma, poderia eu dizer que as suportaria com paciência; mas quando não posso suportar com equanimidade a privação de não te ver, seria intolerável para mim chamar meu estado de ânimo de paciência.
Mas quando não posso tolerar silenciosamente não te ver, é intolerável chamar isso de tolerância. Sendo tu o que és, seria mais intolerável tolerar a tua falta. É bom, então, que eu não possa tolerar com uma alma tranquila aquilo que, se eu a tolerasse calmamente, não seria tolerável, e eu mesmo não suportaria como alma tranquila.
O que me aconteceu é estranho, mas é verdadeiro; lamento porque não te vejo, e a própria aflição me conforta; pois não admiro nem cobiço a coragem com que a ausência de uma pessoa boa, como tu, é suportada pacientemente. Não ansiamos pela Jerusalém celestial? E quanto mais impacientemente ansiamos por ela, não nos submetemos mais pacientemente a todas as coisas por causa disso? Quem pode se privar tanto da alegria de ver-te? Que não devemos lamentar quando tu não és mais visto? Eu, pelo menos, não posso fazer nem um nem o outro; e vendo que, é claro, se pudesse, seria apenas pisoteando sob os pés o sentimento certo e natural. Alegro-me por não poder fazer isso, e neste regozijo encontro algum consolo. Não é, portanto, a remoção, mas a contemplação desta dor que me consola.
Não me culpes, peço-te, com essa serenidade de espírito devota que tão eminentemente te distingue. Não digas que estou errado em me entristecer porque ainda não te conheço, quando revelaste à minha vista tua alma, teu homem interior. Pois se eu estivesse viajando em qualquer lugar, na cidade à qual tu pertences, e se eu tivesse vindo a conhecer-te como meu irmão e amigo, e como um cristão tão eminente como és, um homem tão nobre, como tu poderias pensar que não seria uma decepção para mim se eu não tivesse permissão para conhecer tua casa? Como, então, posso fazer agora senão lamentar que eu ainda não tenha visto teu rosto e tua figura, a morada daquela alma que eu vim a conhecer como minha própria alma?
Mas quando tu as ler, ó meu santo Paulino!, não deixe que as coisas que a Verdade disse por minha fraca instrumentalidade te arrastem a ponto de impedir-te de observar atentamente o que eu mesmo disse. Se tu beberes com ganância as coisas boas e verdadeiras que me foram dadas como ministro, não quero que te esqueças de rezar por meus erros e fraquezas. Em tudo o que vês, que justamente não gostas, estás vendo a mim mesmo; mas em tudo o que em meus livros aprovas, pelo dom do Espírito Santo que te foi dado, deves amar e louvar Aquele com quem está a fonte da vida, e em cuja luz veremos a luz, não às escuras como aqui, mas face a face 1.Quando releio meus escritos e descubro algo que se deve à ação do velho fermento em mim 2, culpo-me por isso com verdadeira dor; mas se algo do que eu disse vem, pelo dom de Deus, do pão ázimo da sinceridade e da verdade, regozijo-me com tremor.”