Santo Agostinho e a Bíblia: descubra como o Doutor da Graça leu, viveu e ensinou as Escrituras, unindo fé, razão e amor à Palavra de Deus.
Santo Agostinho e a Bíblia: descubra como o Doutor da Graça leu, viveu e ensinou as Escrituras, unindo fé, razão e amor à Palavra de Deus.
Santo Agostinho e a Bíblia são inseparáveis quando falamos da história da interpretação cristã. O Doutor da Graça foi um dos maiores mestres da Igreja no modo de ler, viver e anunciar as Sagradas Escrituras.
Neste artigo, você vai descobrir como a Bíblia moldou a vida de Santo Agostinho e como seus ensinamentos continuam atuais para quem deseja ler a Palavra de Deus com profundidade, amor e fidelidade. Boa leitura!
A Bíblia é o coração pulsante da vida da Igreja. Através dela, Deus fala ao Seu povo, revelando progressivamente Seu plano de salvação e formando, pela Palavra, uma comunidade de fé, esperança e caridade. Como ensina o Concílio Vaticano II, “nas Sagradas Escrituras, o Pai que está nos céus vem amorosamente ao encontro de seus filhos” 1.
A Igreja não apenas acolhe as Escrituras como Palavra de Deus, mas também as interpreta com autoridade, guiada pelo mesmo Espírito que as inspirou. Essa união entre Bíblia e Tradição, sustentada pelo Magistério, constitui o fundamento seguro da fé católica.
Santo Agostinho viveu profundamente essa relação: ao descobrir a Bíblia, encontrou a verdade e o sentido da vida. Ao mesmo tempo, com sua inteligência e fé, ajudou a Igreja a formular princípios sólidos para a interpretação das Escrituras, lançando bases duradouras para a unidade entre Palavra e Igreja.
Para aprofundar esse tema, vale a pena conferir também nosso artigo O que significa interpretar a Sagrada Escritura em comunhão com a Igreja?, que mostra como essa missão continua viva até hoje.
A Bíblia teve um papel decisivo na conversão de Santo Agostinho. No entanto, sua relação inicial com as Escrituras foi marcada por resistência.
Ele próprio confessa que desprezava sua linguagem, considerando-a “rústica” e inferior aos clássicos filosóficos que admirava, como os de Apuleio 2.
Agostinho buscava a verdade, mas ainda era “indócil”, preso à vaidade intelectual e à heresia maniqueísta 3.
Foi através das homilias de Santo Ambrósio, bispo de Milão, que ele começou a perceber a profundidade espiritual da Escritura. As palavras simples escondiam um sentido elevado, digno de reverência.
Santa Mônica, sua mãe, pediu ao bispo que falasse com ele. Mas Ambrósio respondeu que Agostinho se convenceria pela própria leitura.
O ponto decisivo veio com o célebre “Toma e lê”. Em meio à angústia interior, Agostinho ouviu uma voz dizendo: “Toma e lê, toma e lê”.
Ele abriu a Bíblia e leu Rm 13,13-14: “Revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e não procureis satisfazer os desejos da carne” 4.
Naquele momento, as trevas da dúvida se dissiparam. Alípio, seu amigo, também leu o versículo seguinte: “Recebei ao fraco na fé”, e aplicou-o a si mesmo.
A Palavra de Deus foi instrumento direto da graça na conversão dos dois.
Leia mais sobre como se deu a conversão de Santo Agostinho.
A leitura da Bíblia, para Santo Agostinho, não era um exercício meramente intelectual. Era, antes de tudo, um caminho espiritual de encontro com Deus.
Seu método unia fé, razão, oração e a vida da Igreja. Ele compreendia que as Escrituras continham vários níveis de sentido, todos ordenados à caridade.
Um dos pilares de sua abordagem está no tratado A Doutrina Cristã. Ali, Agostinho afirma que “toda leitura e estudo das Escrituras apoia-se em dois caminhos: o de discernir aquilo que deve ser interpretado, e o de transmitir aquilo que foi interpretado” 5.
Ele ensina a distinguir entre “res” (coisas) e “signa” (sinais), ressaltando que muitos textos bíblicos, especialmente no Antigo Testamento, são sinais de realidades espirituais mais elevadas.
Outro princípio central é o da caridade: toda interpretação válida deve conduzir ao amor de Deus e do próximo. “A ciência incha, mas a caridade edifica” 6, dizia ele, alertando contra uma leitura fria e vaidosa.
Agostinho também estabeleceu a chamada “regra da fé”: se uma leitura literal contradiz a fé ou a moral cristã, o texto deve ser lido de modo figurado. Isso vale, por exemplo, para os salmos imprecatórios.
Sua leitura era profundamente eclesial. Ele dizia: “Eu não daria crédito ao Evangelho se não fosse a autoridade da Igreja Católica”. A Igreja era, para ele, a guardiã legítima da Escritura.
Agostinho reconhecia ainda os diversos sentidos espirituais da Bíblia: alegórico, moral e anagógico — distinção que mais tarde seria incorporada pelo Catecismo 7.
Sua exegese não era apenas para eruditos. Ele visava formar pregadores e catequistas, como deixa claro na Doutrina Cristã, que divide em três partes sobre a compreensão e uma quarta sobre a comunicação da fé.
A Igreja Católica reconhece em Santo Agostinho um dos maiores mestres da interpretação bíblica. Sua vida e obras influenciaram profundamente a maneira como a Escritura é lida, ensinada e vivida na tradição católica.
Ele não apenas amou a Bíblia, mas ajudou a formular os princípios fundamentais de sua leitura, sempre em fidelidade à Tradição da Igreja e ao Magistério.
Sua obra A Doutrina Cristã tornou-se um verdadeiro manual para pregadores, teólogos e fiéis. Nela, Agostinho ensina que “alguns preceitos são dados a todos em comum, enquanto outros são dirigidos a diferentes estados de vida” 8.
Outro legado precioso é o tratado Da Concordância dos Evangelistas, em que Agostinho estuda a harmonia entre os quatro Evangelhos. Ele mostra como os hagiógrafos, inspirados por Deus, apresentam de maneira complementar o único Evangelho de Cristo.
Na obra, o santo desmonta as acusações de contradição levantadas por pagãos da época do Império Romano, mostrando que as diferenças de estilo ou ordem narrativa não comprometem a verdade dos fatos.
Essa defesa permanece atual diante das críticas modernas — muitas delas repetindo os mesmos erros de interpretação. Agostinho oferece uma resposta firme e clara, útil tanto contra o ceticismo externo quanto contra interpretações desequilibradas dentro da própria Igreja.
Para ele, a Escritura é uma unidade inspirada pelo mesmo Espírito. Por isso, escreveu também Contra Fausto, combatendo o maniqueísmo e defendendo a continuidade entre Antigo e Novo Testamento.
Sua fidelidade à Igreja é um marco: “Eu não daria crédito ao Evangelho se não fosse a autoridade da Igreja Católica” 9. Essa convicção molda sua leitura bíblica e fundamenta sua contribuição à exegese católica.
A teologia e a espiritualidade católicas foram profundamente marcadas por ele. Ler a Bíblia com Santo Agostinho é aprender a amar a Palavra na escola da Igreja, com fidelidade, inteligência e caridade.
As ideias de Santo Agostinho sobre a Bíblia não foram apenas reflexões teóricas, mas diretrizes práticas que moldaram a tradição interpretativa da Igreja. A seguir, apresentamos os principais princípios que orientam sua leitura espiritual e teológica das Escrituras.
Para Santo Agostinho, a Sagrada Escritura está cheia de símbolos. Esses símbolos — ou “signa” — apontam para realidades mais profundas que os olhos não veem, mas o coração iluminado pela fé pode reconhecer.
Em seu tratado A Doutrina Cristã, ele distingue entre “res” (coisas) e “signa” (sinais). As coisas são realidades em si mesmas. Já os sinais são realidades que remetem a outras, espirituais ou invisíveis.
Essa distinção é fundamental para ler a Bíblia com sabedoria. Muitas passagens, especialmente no Antigo Testamento, têm sentido mais profundo do que o literal. São como janelas para os mistérios de Deus.
Agostinho ensina que compreender esses sinais exige humildade, oração e familiaridade com a vida da Igreja. Sem isso, corre-se o risco de tomar os símbolos ao pé da letra ou de interpretá-los segundo critérios meramente humanos.
Para ele, o verdadeiro leitor da Bíblia deve aprender a “elevar-se das realidades visíveis às invisíveis”. Isso vale tanto para os personagens quanto para os ritos, gestos e narrativas da história sagrada.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho, portanto, é aprender a ver além da letra — para encontrar, nos sinais, a verdade que salva.
Entre os princípios mais profundos do método agostiniano está a distinção entre fruir e usar. Segundo ele, algumas coisas são feitas para serem usadas como meios; outras, para serem desfrutadas como fins.
Deus é o único que deve ser fruído — ou seja, amado por si mesmo. Tudo o mais deve ser usado em vista d’Ele, inclusive a Sagrada Escritura.
A interpretação bíblica, portanto, não é um fim em si. Seu objetivo último é levar o leitor à caridade, ao amor verdadeiro por Deus e pelo próximo.
Agostinho adverte: “A ciência incha, mas a caridade edifica” 6. O conhecimento bíblico que não conduz à humildade e ao amor pode ser vaidade espiritual.
Ele também afirma que nem todos os preceitos das Escrituras têm o mesmo destinatário. “Alguns preceitos são dados a todos em comum, enquanto outros são dirigidos a diferentes estados de vida” 10.
Por isso, é preciso discernimento espiritual para aplicar corretamente o ensinamento bíblico à vida concreta, sem rigorismos nem permissividades.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho é, portanto, um caminho de caridade. Não basta entender a letra — é preciso permitir que a Palavra transforme o coração e gere frutos de amor.
Santo Agostinho ensina que nem toda passagem bíblica deve ser interpretada literalmente. Quando a leitura literal de um texto parece contradizer a fé ou a moral cristã, é necessário buscar seu sentido espiritual.
Esse princípio é conhecido como “regra da fé”. Ele afirma: “Se da leitura literal resultar algo que ofende a reta fé ou os costumes, deve-se entender de modo figurado” 11.
Por exemplo, os salmos imprecatórios, em que se invoca o castigo divino sobre os inimigos, não podem ser tomados ao pé da letra como desejo de vingança. Eles expressam, na linguagem da época, a luta espiritual contra o pecado e o mal.
Agostinho destaca que o amor aos inimigos, ensinado por Cristo, é um critério hermenêutico central. A Bíblia deve sempre ser lida à luz da caridade e da unidade da fé.
Essa regra impede interpretações distorcidas que poderiam justificar ódio, violência ou erros doutrinais. Ela protege a leitura bíblica de desvios e mantém sua fidelidade ao coração do Evangelho.
Assim, a “regra da fé” é um verdadeiro farol na interpretação católica das Escrituras. Ela nos ajuda a enxergar além da letra, com os olhos do Espírito e em comunhão com a Igreja.
Para se aprofundar nesse tópico, leia também o artigo sobre as diferenças entre o sentido literal e figurado na Bíblia.
Santo Agostinho reconhecia que a Sagrada Escritura possui diversos sentidos. Ele lia a Bíblia não apenas em sua dimensão literal, mas também espiritual, discernindo nela profundezas que alimentam a fé e a caridade.
Inspirado pela tradição patrística, Agostinho identificava três sentidos espirituais além do literal: o alegórico, que aponta para Cristo e a Igreja; o moral, que orienta a vida cristã; e o anagógico, que conduz às realidades eternas. Esses sentidos seriam mais tarde assumidos e sistematizados pelo Catecismo da Igreja Católica 7.
Essa riqueza interpretativa não era um convite ao subjetivismo, mas à meditação profunda da Palavra, sempre iluminada pela fé da Igreja. Agostinho ensinava que os múltiplos sentidos da Bíblia não se contradizem, pois têm um único fim: conduzir à verdade plena em Cristo.
Seu método exegético continua sendo uma referência segura. Ele nos convida a ler com atenção, humildade e oração, buscando na letra o espírito que vivifica 12, e permitindo que a Palavra penetre a alma como “espada de dois gumes” 13.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho é mergulhar no coração da fé católica. Sua vida transformada pela Palavra e sua sabedoria na interpretação continuam a iluminar os caminhos da Igreja.
Agostinho nos ensina que a Escritura não é apenas texto, mas encontro com Deus vivo. Com ele, aprendemos a ler com fé, a interpretar com caridade e a viver com coerência.
Que seu exemplo nos inspire a amar a Palavra, acolher a Igreja e crescer em santidade.
O maior clube de leitores católicos do Brasil.
Santo Agostinho e a Bíblia são inseparáveis quando falamos da história da interpretação cristã. O Doutor da Graça foi um dos maiores mestres da Igreja no modo de ler, viver e anunciar as Sagradas Escrituras.
Neste artigo, você vai descobrir como a Bíblia moldou a vida de Santo Agostinho e como seus ensinamentos continuam atuais para quem deseja ler a Palavra de Deus com profundidade, amor e fidelidade. Boa leitura!
A Bíblia é o coração pulsante da vida da Igreja. Através dela, Deus fala ao Seu povo, revelando progressivamente Seu plano de salvação e formando, pela Palavra, uma comunidade de fé, esperança e caridade. Como ensina o Concílio Vaticano II, “nas Sagradas Escrituras, o Pai que está nos céus vem amorosamente ao encontro de seus filhos” 1.
A Igreja não apenas acolhe as Escrituras como Palavra de Deus, mas também as interpreta com autoridade, guiada pelo mesmo Espírito que as inspirou. Essa união entre Bíblia e Tradição, sustentada pelo Magistério, constitui o fundamento seguro da fé católica.
Santo Agostinho viveu profundamente essa relação: ao descobrir a Bíblia, encontrou a verdade e o sentido da vida. Ao mesmo tempo, com sua inteligência e fé, ajudou a Igreja a formular princípios sólidos para a interpretação das Escrituras, lançando bases duradouras para a unidade entre Palavra e Igreja.
Para aprofundar esse tema, vale a pena conferir também nosso artigo O que significa interpretar a Sagrada Escritura em comunhão com a Igreja?, que mostra como essa missão continua viva até hoje.
A Bíblia teve um papel decisivo na conversão de Santo Agostinho. No entanto, sua relação inicial com as Escrituras foi marcada por resistência.
Ele próprio confessa que desprezava sua linguagem, considerando-a “rústica” e inferior aos clássicos filosóficos que admirava, como os de Apuleio 2.
Agostinho buscava a verdade, mas ainda era “indócil”, preso à vaidade intelectual e à heresia maniqueísta 3.
Foi através das homilias de Santo Ambrósio, bispo de Milão, que ele começou a perceber a profundidade espiritual da Escritura. As palavras simples escondiam um sentido elevado, digno de reverência.
Santa Mônica, sua mãe, pediu ao bispo que falasse com ele. Mas Ambrósio respondeu que Agostinho se convenceria pela própria leitura.
O ponto decisivo veio com o célebre “Toma e lê”. Em meio à angústia interior, Agostinho ouviu uma voz dizendo: “Toma e lê, toma e lê”.
Ele abriu a Bíblia e leu Rm 13,13-14: “Revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e não procureis satisfazer os desejos da carne” 4.
Naquele momento, as trevas da dúvida se dissiparam. Alípio, seu amigo, também leu o versículo seguinte: “Recebei ao fraco na fé”, e aplicou-o a si mesmo.
A Palavra de Deus foi instrumento direto da graça na conversão dos dois.
Leia mais sobre como se deu a conversão de Santo Agostinho.
A leitura da Bíblia, para Santo Agostinho, não era um exercício meramente intelectual. Era, antes de tudo, um caminho espiritual de encontro com Deus.
Seu método unia fé, razão, oração e a vida da Igreja. Ele compreendia que as Escrituras continham vários níveis de sentido, todos ordenados à caridade.
Um dos pilares de sua abordagem está no tratado A Doutrina Cristã. Ali, Agostinho afirma que “toda leitura e estudo das Escrituras apoia-se em dois caminhos: o de discernir aquilo que deve ser interpretado, e o de transmitir aquilo que foi interpretado” 5.
Ele ensina a distinguir entre “res” (coisas) e “signa” (sinais), ressaltando que muitos textos bíblicos, especialmente no Antigo Testamento, são sinais de realidades espirituais mais elevadas.
Outro princípio central é o da caridade: toda interpretação válida deve conduzir ao amor de Deus e do próximo. “A ciência incha, mas a caridade edifica” 6, dizia ele, alertando contra uma leitura fria e vaidosa.
Agostinho também estabeleceu a chamada “regra da fé”: se uma leitura literal contradiz a fé ou a moral cristã, o texto deve ser lido de modo figurado. Isso vale, por exemplo, para os salmos imprecatórios.
Sua leitura era profundamente eclesial. Ele dizia: “Eu não daria crédito ao Evangelho se não fosse a autoridade da Igreja Católica”. A Igreja era, para ele, a guardiã legítima da Escritura.
Agostinho reconhecia ainda os diversos sentidos espirituais da Bíblia: alegórico, moral e anagógico — distinção que mais tarde seria incorporada pelo Catecismo 7.
Sua exegese não era apenas para eruditos. Ele visava formar pregadores e catequistas, como deixa claro na Doutrina Cristã, que divide em três partes sobre a compreensão e uma quarta sobre a comunicação da fé.
A Igreja Católica reconhece em Santo Agostinho um dos maiores mestres da interpretação bíblica. Sua vida e obras influenciaram profundamente a maneira como a Escritura é lida, ensinada e vivida na tradição católica.
Ele não apenas amou a Bíblia, mas ajudou a formular os princípios fundamentais de sua leitura, sempre em fidelidade à Tradição da Igreja e ao Magistério.
Sua obra A Doutrina Cristã tornou-se um verdadeiro manual para pregadores, teólogos e fiéis. Nela, Agostinho ensina que “alguns preceitos são dados a todos em comum, enquanto outros são dirigidos a diferentes estados de vida” 8.
Outro legado precioso é o tratado Da Concordância dos Evangelistas, em que Agostinho estuda a harmonia entre os quatro Evangelhos. Ele mostra como os hagiógrafos, inspirados por Deus, apresentam de maneira complementar o único Evangelho de Cristo.
Na obra, o santo desmonta as acusações de contradição levantadas por pagãos da época do Império Romano, mostrando que as diferenças de estilo ou ordem narrativa não comprometem a verdade dos fatos.
Essa defesa permanece atual diante das críticas modernas — muitas delas repetindo os mesmos erros de interpretação. Agostinho oferece uma resposta firme e clara, útil tanto contra o ceticismo externo quanto contra interpretações desequilibradas dentro da própria Igreja.
Para ele, a Escritura é uma unidade inspirada pelo mesmo Espírito. Por isso, escreveu também Contra Fausto, combatendo o maniqueísmo e defendendo a continuidade entre Antigo e Novo Testamento.
Sua fidelidade à Igreja é um marco: “Eu não daria crédito ao Evangelho se não fosse a autoridade da Igreja Católica” 9. Essa convicção molda sua leitura bíblica e fundamenta sua contribuição à exegese católica.
A teologia e a espiritualidade católicas foram profundamente marcadas por ele. Ler a Bíblia com Santo Agostinho é aprender a amar a Palavra na escola da Igreja, com fidelidade, inteligência e caridade.
As ideias de Santo Agostinho sobre a Bíblia não foram apenas reflexões teóricas, mas diretrizes práticas que moldaram a tradição interpretativa da Igreja. A seguir, apresentamos os principais princípios que orientam sua leitura espiritual e teológica das Escrituras.
Para Santo Agostinho, a Sagrada Escritura está cheia de símbolos. Esses símbolos — ou “signa” — apontam para realidades mais profundas que os olhos não veem, mas o coração iluminado pela fé pode reconhecer.
Em seu tratado A Doutrina Cristã, ele distingue entre “res” (coisas) e “signa” (sinais). As coisas são realidades em si mesmas. Já os sinais são realidades que remetem a outras, espirituais ou invisíveis.
Essa distinção é fundamental para ler a Bíblia com sabedoria. Muitas passagens, especialmente no Antigo Testamento, têm sentido mais profundo do que o literal. São como janelas para os mistérios de Deus.
Agostinho ensina que compreender esses sinais exige humildade, oração e familiaridade com a vida da Igreja. Sem isso, corre-se o risco de tomar os símbolos ao pé da letra ou de interpretá-los segundo critérios meramente humanos.
Para ele, o verdadeiro leitor da Bíblia deve aprender a “elevar-se das realidades visíveis às invisíveis”. Isso vale tanto para os personagens quanto para os ritos, gestos e narrativas da história sagrada.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho, portanto, é aprender a ver além da letra — para encontrar, nos sinais, a verdade que salva.
Entre os princípios mais profundos do método agostiniano está a distinção entre fruir e usar. Segundo ele, algumas coisas são feitas para serem usadas como meios; outras, para serem desfrutadas como fins.
Deus é o único que deve ser fruído — ou seja, amado por si mesmo. Tudo o mais deve ser usado em vista d’Ele, inclusive a Sagrada Escritura.
A interpretação bíblica, portanto, não é um fim em si. Seu objetivo último é levar o leitor à caridade, ao amor verdadeiro por Deus e pelo próximo.
Agostinho adverte: “A ciência incha, mas a caridade edifica” 6. O conhecimento bíblico que não conduz à humildade e ao amor pode ser vaidade espiritual.
Ele também afirma que nem todos os preceitos das Escrituras têm o mesmo destinatário. “Alguns preceitos são dados a todos em comum, enquanto outros são dirigidos a diferentes estados de vida” 10.
Por isso, é preciso discernimento espiritual para aplicar corretamente o ensinamento bíblico à vida concreta, sem rigorismos nem permissividades.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho é, portanto, um caminho de caridade. Não basta entender a letra — é preciso permitir que a Palavra transforme o coração e gere frutos de amor.
Santo Agostinho ensina que nem toda passagem bíblica deve ser interpretada literalmente. Quando a leitura literal de um texto parece contradizer a fé ou a moral cristã, é necessário buscar seu sentido espiritual.
Esse princípio é conhecido como “regra da fé”. Ele afirma: “Se da leitura literal resultar algo que ofende a reta fé ou os costumes, deve-se entender de modo figurado” 11.
Por exemplo, os salmos imprecatórios, em que se invoca o castigo divino sobre os inimigos, não podem ser tomados ao pé da letra como desejo de vingança. Eles expressam, na linguagem da época, a luta espiritual contra o pecado e o mal.
Agostinho destaca que o amor aos inimigos, ensinado por Cristo, é um critério hermenêutico central. A Bíblia deve sempre ser lida à luz da caridade e da unidade da fé.
Essa regra impede interpretações distorcidas que poderiam justificar ódio, violência ou erros doutrinais. Ela protege a leitura bíblica de desvios e mantém sua fidelidade ao coração do Evangelho.
Assim, a “regra da fé” é um verdadeiro farol na interpretação católica das Escrituras. Ela nos ajuda a enxergar além da letra, com os olhos do Espírito e em comunhão com a Igreja.
Para se aprofundar nesse tópico, leia também o artigo sobre as diferenças entre o sentido literal e figurado na Bíblia.
Santo Agostinho reconhecia que a Sagrada Escritura possui diversos sentidos. Ele lia a Bíblia não apenas em sua dimensão literal, mas também espiritual, discernindo nela profundezas que alimentam a fé e a caridade.
Inspirado pela tradição patrística, Agostinho identificava três sentidos espirituais além do literal: o alegórico, que aponta para Cristo e a Igreja; o moral, que orienta a vida cristã; e o anagógico, que conduz às realidades eternas. Esses sentidos seriam mais tarde assumidos e sistematizados pelo Catecismo da Igreja Católica 7.
Essa riqueza interpretativa não era um convite ao subjetivismo, mas à meditação profunda da Palavra, sempre iluminada pela fé da Igreja. Agostinho ensinava que os múltiplos sentidos da Bíblia não se contradizem, pois têm um único fim: conduzir à verdade plena em Cristo.
Seu método exegético continua sendo uma referência segura. Ele nos convida a ler com atenção, humildade e oração, buscando na letra o espírito que vivifica 12, e permitindo que a Palavra penetre a alma como “espada de dois gumes” 13.
Ler a Bíblia com Santo Agostinho é mergulhar no coração da fé católica. Sua vida transformada pela Palavra e sua sabedoria na interpretação continuam a iluminar os caminhos da Igreja.
Agostinho nos ensina que a Escritura não é apenas texto, mas encontro com Deus vivo. Com ele, aprendemos a ler com fé, a interpretar com caridade e a viver com coerência.
Que seu exemplo nos inspire a amar a Palavra, acolher a Igreja e crescer em santidade.