Você já leu Santo Agostinho? Se não, com certeza deveria! O autor é extremamente atual e neste artigo contamos o motivo. Confira!
Você já leu Santo Agostinho? Se não, com certeza deveria! O autor é extremamente atual e neste artigo contamos o motivo. Confira!
Eu ainda lembro da primeira vez que me deparei com os escritos de Santo Agostinho. Estava fazendo uma aula chamada “Agostinho e Aquino” na faculdade e tive que ler as Confissões de Santo Agostinho junto com o Compêndio de teologia de Santo Tomás de Aquino. A diferença entre os dois era espantosa. Por exemplo, comparamos Santo Tomás e Santo Agostinho no que diz respeito ao fim último do homem:
Por conseguinte, o desejo natural de conhecer não pode estar em nós satisfeito senão quando conhecermos a primeira causa, não de qualquer modo, mas na sua essência. Ora, já foi acima demonstrado que a primeira causa das coisas é Deus. Logo, o fim último da criatura racional é ver Deus na sua essência.1
E agora Santo Agostinho:
Tu mesmo o incitas a deleitar-se nos teus louvores, porque nos fizeste para ti e o nosso coração está inquieto enquanto não descansar em ti.2
Veja também: A história de Santo Agostinho para além das Confissões.
Qual delas você acha que cativou mais a um aluno universitário em busca de Deus?
Agora, admito que isso poderia ser um pouco injusto para Santo Tomás; ele estava escrevendo numa época diferente e em um contexto diferente, para um público diferente, com um objetivo diferente. Na encíclica Aeterni Patris, do Papa Leão XIII, Santo Agostinho é aquele que recebe os méritos de “quem arrebatou a glória” de todos os Padres da Igreja. “Quem com uma poderosa inteligência, e perfeitamente imbuído das ciências sagradas e profanas, lutou com firmeza contra todos os erros de seu tempo, com suprema fé e não menor doutrina”. Mas é de Santo Tomás que se fala que recolheu e aumentou com seus próprios esforços todo o ensinamento escolástico, de modo que “ele é justamente e merecidamente considerado como o baluarte especial e a glória da fé católica”. De fato, “a razão, carregada nas asas de Santo Tomás até sua altura humana, dificilmente pode subir mais alto, enquanto a fé dificilmente poderia esperar da razão mais ajuda ou mais força do que já obteve através dele”. É assim que Santo Tomás, e não Santo Agostinho, é o professor de teologia recomendado pelo Papa Leão XIII a toda a Igreja.
Você também pode conferir sobre a amizade entre os dois neste vídeo:
No entanto, na festa de Santo Agostinho, é oportuno refletir um pouco sobre sua permanente transcendência e seu amplíssimo alcance. Não acredito que minha admiração sobre Santo Agostinho tenha sido a única; seu pensamento teológico e seu estilo encantaram a tantos ao longo da história e, ainda hoje, continuam dando frutos de contemplação.
Carlos Magno, o Imperador do Sacro Império Romano Germânico, admirava tanto a Cidade de Deus de Santo Agostinho que dormia com o livro debaixo de seu travesseiro.
Nas sentenças de Pedro Lombardo, Santo Agostinho é citado dez a quinze vezes mais do que qualquer outro Padre da Igreja, e na Suma Teológica de Santo Tomás, Santo Agostinho é a autoridade mais importante depois da Bíblia. A reverência de Santo Tomás por Santo Agostinho foi tão profunda que mesmo quando ele tinha uma opinião muito diferente, recusava-se a criticá-lo.
Esta influência agostiniana não terminou após a Idade Média. Foi um agostiniano (Martinho Lutero) que iniciou a reforma, e seu maior sistematizador, João Calvino, que declarou certa vez: “Augustinus . . . totus noster est” (“Agostinho é todo nosso”). O teólogo reformador B. B. Warfield declarou: “Agostinho nos deu a Reforma”. Pois a reforma, considerada interiormente, não era nada mais do que o triunfo final da doutrina agostiniana da graça sobre a doutrina agostiniana da Igreja. Ou seja, Santo Agostinho estava em ambos os lados do debate!
Após a Reforma, Santo Agostinho permaneceu preeminente na mente de muitos pensadores influentes. No século XVII, tanto René Descartes como Blaise Pascal viram nele o fundamento de seus próprios projetos filosóficos e teológicos, mesmo que fundamentalmente discordassem3. No século XIX, Friedrich Nietzsche escreveu A genealogia moral, que poderia ser descrita como a Cidade de Deus de Santo Agostinho em sentido inverso. No século XX, as Confissões de Santo Agostinho tornaram-se o modelo para as autobiografías religiosas e seculares: A The Seven Storey Mountain do monge trapista americano Thomas Merton se contrapõe ao Circonfession de Jacques Derrida. E mais ainda, não esqueçamos que é Santo Agostinho quem encabeça a lista de citações de escritores eclesiásticos no Catecismo da Igreja Católica.
Santo Agostinho parece ter uma influência perene, uma capacidade de conversar através de milênios e com todo o mundo. Ele foi chamado de o primeiro medievalista, o primeiro modernista, o primeiro existencialista e o primeiro autobiógrafo. Ele parece ter seguido o “dictum” (ditame)de São Paulo de “Fiz-me tudo para todos”4. Ele tem ensinado ao mundo sobre Deus e seu relacionamento com Ele, histórica e cosmologicamente. Ele ajudou a Igreja a compreender a Santíssima Trindade, os sacramentos e a doutrina da Graça (ele é, afinal de contas, o Doctor Gratiae – Doutor da Graça). E se a história serve ainda de indicação, ele continuará ensinando ao mundo, à Igreja e a cada um de nós sobre nós mesmos e sobre nosso mais profundo desejo de Deus.
No livro X das suas Confissões, Santo Agostinho diz de Deus: “Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!”. Talvez possamos dizer algo semelhante do próprio Santo Agostinho: “Sempre te amamos, mestre tão antigo e tão novo”.
*Este post foi originalmente escrito por: P. Bonaventure Chapman, OP e traduzido pela Equipe MBC.
Leia também: Santo Agostinho: vida, conversão, influência e obra
Eu ainda lembro da primeira vez que me deparei com os escritos de Santo Agostinho. Estava fazendo uma aula chamada “Agostinho e Aquino” na faculdade e tive que ler as Confissões de Santo Agostinho junto com o Compêndio de teologia de Santo Tomás de Aquino. A diferença entre os dois era espantosa. Por exemplo, comparamos Santo Tomás e Santo Agostinho no que diz respeito ao fim último do homem:
Por conseguinte, o desejo natural de conhecer não pode estar em nós satisfeito senão quando conhecermos a primeira causa, não de qualquer modo, mas na sua essência. Ora, já foi acima demonstrado que a primeira causa das coisas é Deus. Logo, o fim último da criatura racional é ver Deus na sua essência.1
E agora Santo Agostinho:
Tu mesmo o incitas a deleitar-se nos teus louvores, porque nos fizeste para ti e o nosso coração está inquieto enquanto não descansar em ti.2
Veja também: A história de Santo Agostinho para além das Confissões.
Qual delas você acha que cativou mais a um aluno universitário em busca de Deus?
Agora, admito que isso poderia ser um pouco injusto para Santo Tomás; ele estava escrevendo numa época diferente e em um contexto diferente, para um público diferente, com um objetivo diferente. Na encíclica Aeterni Patris, do Papa Leão XIII, Santo Agostinho é aquele que recebe os méritos de “quem arrebatou a glória” de todos os Padres da Igreja. “Quem com uma poderosa inteligência, e perfeitamente imbuído das ciências sagradas e profanas, lutou com firmeza contra todos os erros de seu tempo, com suprema fé e não menor doutrina”. Mas é de Santo Tomás que se fala que recolheu e aumentou com seus próprios esforços todo o ensinamento escolástico, de modo que “ele é justamente e merecidamente considerado como o baluarte especial e a glória da fé católica”. De fato, “a razão, carregada nas asas de Santo Tomás até sua altura humana, dificilmente pode subir mais alto, enquanto a fé dificilmente poderia esperar da razão mais ajuda ou mais força do que já obteve através dele”. É assim que Santo Tomás, e não Santo Agostinho, é o professor de teologia recomendado pelo Papa Leão XIII a toda a Igreja.
Você também pode conferir sobre a amizade entre os dois neste vídeo:
No entanto, na festa de Santo Agostinho, é oportuno refletir um pouco sobre sua permanente transcendência e seu amplíssimo alcance. Não acredito que minha admiração sobre Santo Agostinho tenha sido a única; seu pensamento teológico e seu estilo encantaram a tantos ao longo da história e, ainda hoje, continuam dando frutos de contemplação.
Carlos Magno, o Imperador do Sacro Império Romano Germânico, admirava tanto a Cidade de Deus de Santo Agostinho que dormia com o livro debaixo de seu travesseiro.
Nas sentenças de Pedro Lombardo, Santo Agostinho é citado dez a quinze vezes mais do que qualquer outro Padre da Igreja, e na Suma Teológica de Santo Tomás, Santo Agostinho é a autoridade mais importante depois da Bíblia. A reverência de Santo Tomás por Santo Agostinho foi tão profunda que mesmo quando ele tinha uma opinião muito diferente, recusava-se a criticá-lo.
Esta influência agostiniana não terminou após a Idade Média. Foi um agostiniano (Martinho Lutero) que iniciou a reforma, e seu maior sistematizador, João Calvino, que declarou certa vez: “Augustinus . . . totus noster est” (“Agostinho é todo nosso”). O teólogo reformador B. B. Warfield declarou: “Agostinho nos deu a Reforma”. Pois a reforma, considerada interiormente, não era nada mais do que o triunfo final da doutrina agostiniana da graça sobre a doutrina agostiniana da Igreja. Ou seja, Santo Agostinho estava em ambos os lados do debate!
Após a Reforma, Santo Agostinho permaneceu preeminente na mente de muitos pensadores influentes. No século XVII, tanto René Descartes como Blaise Pascal viram nele o fundamento de seus próprios projetos filosóficos e teológicos, mesmo que fundamentalmente discordassem3. No século XIX, Friedrich Nietzsche escreveu A genealogia moral, que poderia ser descrita como a Cidade de Deus de Santo Agostinho em sentido inverso. No século XX, as Confissões de Santo Agostinho tornaram-se o modelo para as autobiografías religiosas e seculares: A The Seven Storey Mountain do monge trapista americano Thomas Merton se contrapõe ao Circonfession de Jacques Derrida. E mais ainda, não esqueçamos que é Santo Agostinho quem encabeça a lista de citações de escritores eclesiásticos no Catecismo da Igreja Católica.
Santo Agostinho parece ter uma influência perene, uma capacidade de conversar através de milênios e com todo o mundo. Ele foi chamado de o primeiro medievalista, o primeiro modernista, o primeiro existencialista e o primeiro autobiógrafo. Ele parece ter seguido o “dictum” (ditame)de São Paulo de “Fiz-me tudo para todos”4. Ele tem ensinado ao mundo sobre Deus e seu relacionamento com Ele, histórica e cosmologicamente. Ele ajudou a Igreja a compreender a Santíssima Trindade, os sacramentos e a doutrina da Graça (ele é, afinal de contas, o Doctor Gratiae – Doutor da Graça). E se a história serve ainda de indicação, ele continuará ensinando ao mundo, à Igreja e a cada um de nós sobre nós mesmos e sobre nosso mais profundo desejo de Deus.
No livro X das suas Confissões, Santo Agostinho diz de Deus: “Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!”. Talvez possamos dizer algo semelhante do próprio Santo Agostinho: “Sempre te amamos, mestre tão antigo e tão novo”.
*Este post foi originalmente escrito por: P. Bonaventure Chapman, OP e traduzido pela Equipe MBC.
Leia também: Santo Agostinho: vida, conversão, influência e obra