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Exorcismo: o que a Igreja Católica ensina?

Exorcismo na Igreja Católica: entenda o que é, como funciona e por que é um sacramental no combate espiritual contra o mal.

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Exorcismo: o que a Igreja Católica ensina?

Exorcismo na Igreja Católica: entenda o que é, como funciona e por que é um sacramental no combate espiritual contra o mal.

Data da Publicação: 24/07/2025
Tempo de leitura:
Autor: Redação MBC
Data da Publicação: 24/07/2025
Tempo de leitura:
Autor: Redação MBC

O exorcismo é um tema que desperta curiosidade, mas também é alvo de muitos mitos e equívocos. No contexto católico, trata-se de uma prática séria, fundamentada na fé e na tradição, definida pelo Catecismo da Igreja Católica 1 como “uma oração feita com autoridade, para que uma pessoa ou coisa seja protegida contra o poder do maligno e libertada do seu domínio”. Este artigo apresenta o que a Igreja ensina sobre essa prática, destacando sua fundamentação bíblica, teológica e pastoral.

O que é exorcismo segundo a Igreja Católica?

De acordo com o Catecismo e o Ritual Romano, o exorcismo é uma oração solene realizada em nome de Cristo, pela qual a Igreja pede a libertação de uma pessoa ou objeto sob influência demoníaca. A Catholic Encyclopedia descreve-o como um “ato solene de adjuração” — ou seja, uma ordem feita com autoridade, em nome de Deus, para que o demônio abandone a pessoa ou o lugar onde atua.

Diferentemente de práticas supersticiosas ou mágicas, o exorcismo católico é um rito legítimo da Igreja, fundamentado na fé e na autoridade recebida de Cristo. Pe. René Laurentin ressalta que ele não é um sacramento – que confere a graça ex opere operato (expressão latina que significa “pelo próprio fato de ser realizado”), ou seja, que atua independentemente da disposição do ministro –, mas um sacramental, cuja eficácia está ligada à fé da Igreja e à disposição do sacerdote exorcista e do fiel. Essa forma de ação é chamada ex opere operantis, isto é, depende da colaboração e da fé daqueles que participam do rito.

Assim, o exorcismo é uma expressão da vitória de Cristo sobre o mal, sendo realizado de forma sóbria e controlada, longe de qualquer conotação espetacular ou sensacionalista.

Exorcismo menor e exorcismo maior

A Igreja distingue duas formas principais de exorcismo: o exorcismo menor e o exorcismo maior. O exorcismo menor está presente nos ritos do Batismo, e consiste em orações para fortalecer o catecúmeno contra as tentações e libertá-lo da influência do maligno, preparando-o para a vida nova em Cristo. Esse tipo de exorcismo também pode ser usado em bênçãos simples (casas, objetos) e em outros ritos de proteção previstos no apêndice do Ritual Romano.

Já o exorcismo maior, também chamado de solene, é destinado a casos de possessão demoníaca. Trata-se de um rito mais complexo e reservado, que só pode ser realizado por um sacerdote autorizado pelo bispo diocesano, conforme prevê o Código de Direito Canônico 2.

Ambos os exorcismos têm como finalidade manifestar a autoridade de Cristo sobre os espíritos malignos, mas diferem quanto à sua aplicação: o menor é preventivo e preparatório, enquanto o maior é um rito de libertação frente a uma possessão efetiva.

Que tal rezar o Pequeno Exorcismo de São Miguel Arcanjo, uma oração tradicional composta pelo Papa Leão XIII?

Fundamentação bíblica do exorcismo

A prática do exorcismo tem base sólida nas Escrituras. Nos Evangelhos, Jesus realiza diversos exorcismos como sinais de sua missão messiânica: em Cafarnaum, expulsa um espírito imundo 3; liberta o endemoniado geraseno 4, revelando a pluralidade demoníaca; cura um menino possuído que sofria convulsões 5 e liberta a filha da mulher cananeia à distância 6.

Além desses relatos, Pe. Laurentin destaca que os Evangelhos deixam evidente a distinção que Jesus faz entre possessão e enfermidades comuns, rejeitando reduções que explicam tais episódios apenas como curas médicas. Ele sublinha ainda o ensinamento de Cristo em Mc 9,29 — “Essa casta só pode ser expulsa com oração e jejum” — conectando-o ao contexto e evidenciando a dimensão espiritual profunda desse combate.

Por fim, Jesus transmite explicitamente aos apóstolos o poder de expulsar demônios 7 e, antes de ascender ao Céu, confirma que essa autoridade permaneceria na Igreja, como parte de sua missão: “Em meu nome expulsarão demônios” 8. Essa continuidade bíblica fundamenta o ministério exorcístico exercido de forma oficial pelos apóstolos e seus sucessores ao longo dos séculos.

O que a Igreja ensina sobre possessão e influência demoníaca?

A Igreja ensina que o demônio é uma realidade pessoal, não apenas um símbolo ou uma metáfora para o mal. Pe. Laurentin explica que ele é ao mesmo tempo ‘símbolo e realidade’: um anjo decaído que se opõe a Deus e busca afastar as pessoas d’Ele.

A Escritura também aponta para a pluralidade dos espíritos malignos, como se vê no episódio do geraseno, onde o possesso afirma ser habitado por muitos demônios — ‘Legião é o meu nome, porque somos muitos’ 9.

Essa realidade nos ajuda a compreender que a ação demoníaca pode se manifestar de diferentes formas: a tentação, que busca afastar a pessoa de Deus; a opressão e a obsessão, que envolvem ataques espirituais mais intensos; e a possessão, em que o maligno, de modo extraordinário, toma posse do corpo de uma pessoa (sem jamais dominar sua alma). O Ritual Romano e a experiência pastoral da Igreja reconhecem essas gradações, exigindo discernimento para identificar corretamente cada caso.

Saiba mais sobre o que a Igreja ensina a respeito dos seres espirituais, anjos e demônios.

Como distinguir ação demoníaca de doenças psíquicas?

A Igreja orienta que, antes de realizar um exorcismo maior, deve haver um criterioso discernimento, que inclui a consulta a profissionais de saúde, para descartar causas naturais ou psiquiátricas. Essa prudência, prevista no Ritual Romano e reforçada em instruções disciplinares da Igreja, evita que fenômenos psicológicos ou doenças sejam confundidos com possessão. O Pe. Laurentin adverte que “o demônio pode disfarçar-se por trás de sintomas físicos ou psíquicos”, 10 reiterando a necessidade de uma avaliação cuidadosa e multidisciplinar. 

Sinais que podem indicar a necessidade de exorcismo

O Ritual Romano lista alguns sinais clássicos que podem indicar a necessidade de um exorcismo maior. Entre eles estão: falar línguas desconhecidas ou compreender idiomas jamais estudados; revelar conhecimentos ocultos que a pessoa não poderia ter por meios naturais; manifestar força física desproporcional à sua condição; e demonstrar aversão intensa a símbolos e objetos sagrados 11. Esses sinais, contudo, não são provas absolutas, e por isso a Igreja orienta que sejam avaliados com extrema prudência antes de autorizar o rito.

Para isso, o exorcista deve conduzir entrevistas detalhadas com a pessoa, ouvir testemunhas, consultar profissionais de saúde e submeter o caso ao discernimento do bispo, que é o responsável último por conceder a autorização. Essa abordagem garante que o rito seja realizado apenas quando há certeza moral suficiente sobre a ação demoníaca, evitando interpretações precipitadas e preservando a integridade do ministério exorcístico.

Quem pode realizar um exorcismo?

O exorcismo maior é reservado exclusivamente a um sacerdote exorcista, ou seja, um presbítero designado pelo bispo diocesano e com autorização expressa para exercer esse ministério.

O Código de Direito Canônico dispõe: “Nenhum sacerdote pode legitimamente realizar exorcismos sobre os possuídos, a não ser que tenha obtido licença peculiar e expressa do Ordinário do lugar.”

Esse sacerdote deve ter sólida vida espiritual, prudência pastoral e preparo específico para lidar com casos de influência demoníaca, como orienta o Ritual Romano. Ainda sobre isso, Pe. Laurentin resume: “O exorcista deve possuir santidade e prudência, mas também dons de discernimento, de autoridade, de contato e de influência” 12. Além disso, as diretrizes da Congregação para a Doutrina da Fé 13 reforçam que essas permissões devem ser concedidas com grande cautela, e que o exorcismo não pode ser inserido na celebração da Santa Missa, dos sacramentos ou da Liturgia das Horas, mantendo-se sempre como um rito próprio e distinto.

O papel do bispo e a autorização eclesiástica

O bispo diocesano é a autoridade máxima em matéria de exorcismos dentro de sua diocese. A ele compete avaliar cada caso, discernir a necessidade do rito e conceder a licença específica para que um sacerdote possa realizá-lo. O Ritual Romano destaca que o exorcismo maior deve ser conduzido sob sua orientação, e a Congregação para a Doutrina da Fé reitera que essa autorização não deve ser concedida de forma automática, mas após uma análise cuidadosa, preservando a dignidade do rito e a segurança pastoral.

O exorcista oficial da diocese

O sacerdote exorcista, oficialmente designado pelo bispo, atua como ministro específico para este rito. Ele deve manter um vínculo estreito com o Ordinário, apresentando relatórios, recebendo orientações e agindo sempre em comunhão com a autoridade eclesial. Como lembra o Pe. Laurentin, “o exorcista não age por conta própria, mas como delegado da Igreja, unido ao seu bispo e ao corpo eclesial” 14. Essa relação garante que o ministério seja exercido com equilíbrio e obediência, evitando desvios pessoais e mantendo a integridade da missão.

Reze conosco a Novena ao Padre Pio, que lutou durante toda sua vida contra o demônio.

O Rito do Exorcismo: como é realizado

O Ritual Romano descreve que o exorcismo maior deve ser conduzido com sobriedade, evitando qualquer prática supersticiosa ou teatral. Segundo o Pe. Laurentin, “o rito coloca o possesso diante de Cristo, proclamando a Palavra que liberta e invocando a força da cruz, enquanto a Igreja intercede com perseverança até que se manifeste a vitória do Senhor” 15.

No decorrer do rito, o sacerdote exorcista recorre a sinais e gestos que expressam a autoridade da Igreja: a imposição das mãos sobre a pessoa, o uso da estola violeta como sinal do ministério ordenado, o crucifixo que recorda a vitória de Cristo sobre o mal e, quando oportuno, o uso de relíquias. Essa configuração preserva a essência do exorcismo tal como transmitida ao longo dos séculos. Embora costume acontecer em uma igreja ou capela, o rito pode ser realizado em outros locais apropriados, sempre com a presença de testemunhas idôneas e autorização do bispo.

Elementos do rito: oração, sacramentais e autoridade de Cristo

O exorcismo não é um ato mágico, mas uma súplica solene feita pela Igreja em nome de Cristo, cuja autoridade é a verdadeira força que expulsa o maligno. Mais do que gestos exteriores, trata-se de um encontro espiritual em que a Palavra de Deus, a oração e o uso dos sacramentais manifestam a presença salvífica de Cristo e a ação de sua graça. O Pe. Laurentin destaca que “a eficácia do exorcismo depende da fé autêntica e de uma vida de oração fortalecida pelo jejum, como ensinou Jesus: ‘Essa casta só pode ser expulsa com oração e jejum’” 16. Assim, o rito une a autoridade da Igreja ao esforço espiritual do fiel, exigindo tanto a intervenção do ministro quanto a disposição interior de quem busca libertação.

Outro sacramental que pode ser usado tanto no rito do exorcismo quanto na vida cotidiana dos fiéis leigos é a água benta.

O que a Igreja adverte sobre o exorcismo

A Igreja reforça que o exorcismo não é um espetáculo, mas um ato profundamente espiritual, que deve ser realizado com discrição e sob orientação segura. Ele exige prudência para evitar abusos ou distorções e precisa manter-se fiel ao que a Igreja prevê em sua doutrina, sem acréscimos supersticiosos ou desvios do seu objetivo principal: invocar, com a autoridade de Cristo, a libertação da pessoa ou do lugar oprimido pela presença e influência do maligno.

Perigos do esoterismo e “exorcismos” leigos

A Igreja também alerta para os riscos de práticas não autorizadas que se apresentam como exorcismos, mas que não têm vínculo com sua doutrina ou disciplina. O Pe. Laurentin denuncia a proliferação de “rituais paralelos”, afirmando que “multiplicam-se práticas improvisadas que nada têm de cristãs, conduzidas por curandeiros ou líderes religiosos sem mandato, e que misturam superstição, ocultismo e sincretismo” 17. Essas práticas não só são ineficazes espiritualmente, como expõem as pessoas a maiores perigos, especialmente quando associadas ao satanismo, ao espiritismo e à correntes ocultistas. 

Importância da vida sacramental como proteção

Além do exorcismo, a Igreja ensina que a principal proteção contra o mal está na vida cristã ordinária. A participação frequente na Eucaristia, a confissão regular, a oração pessoal e comunitária e a prática da caridade são meios eficazes para fortalecer o fiel contra as investidas do maligno. O Pe. Laurentin recorda que “o exorcismo não substitui a conversão e a vida sacramental, que são a verdadeira defesa do cristão contra o mal” 18. Dessa forma, a luta contra o demônio começa no cotidiano, com a vivência sincera da fé e a busca contínua pela graça de Deus.

Saiba como fazer uma boa confissão.

Exorcismo e a vida espiritual do fiel

O exorcismo, como rito particular da Igreja, expressa a missão de Cristo de libertar a humanidade do poder do maligno de forma plena e definitiva. Para os católicos, isso se traduz em viver a fé de modo concreto por meio da oração, da participação nos sacramentos e da confiança na providência divina. Como recorda o Evangelho: “Eis que vos dei poder para pisar serpentes e escorpiões e sobre toda a força do inimigo” 19. Essa autoridade, comunicada à Igreja, se manifesta especialmente nesse ministério.

O Pe. Laurentin resume essa realidade ao dizer que o exorcismo “não é um ato isolado, mas parte de um mapa espiritual que conduz à vitória final de Cristo sobre o mal” 20. Assim, esse rito deve ser compreendido como um recurso que a Igreja coloca a serviço do povo de Deus, sem ocupar o lugar central que pertence à vivência cotidiana da fé. É nessa caminhada cristã que se experimenta plenamente a vitória do Senhor, numa vida coerente com o Evangelho.

Já ouviu falar da Quaresma de São Miguel? Descubra o que é e como participar.

Referências

  1. n. 1673[]
  2. cân. 1172[]
  3. Mc 1,23-27[]
  4. Mc 5,1-20[]
  5. Mc 9,14-29[]
  6. Mt 15,21-28[]
  7. Mc 6,7; Lc 10,17[]
  8. Mc 16,17[]
  9. Mc 5,9[]
  10. Laurentin, p. 142[]
  11. cf. De Exorcismis et Supplicationibus Quibusdam, Praenotanda, n. 16[]
  12. Laurentin, p. 158[]
  13. Carta de 29 de setembro de 1985[]
  14. Laurentin, p. 160[]
  15. Laurentin, p. 152[]
  16. Laurentin, p. 149[]
  17. Laurentin, p. 163[]
  18. Laurentin, p. 170[]
  19. Lc 10,19[]
  20. Laurentin, p. 175[]
Redação MBC

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O maior clube de leitores católicos do Brasil.

O exorcismo é um tema que desperta curiosidade, mas também é alvo de muitos mitos e equívocos. No contexto católico, trata-se de uma prática séria, fundamentada na fé e na tradição, definida pelo Catecismo da Igreja Católica 1 como “uma oração feita com autoridade, para que uma pessoa ou coisa seja protegida contra o poder do maligno e libertada do seu domínio”. Este artigo apresenta o que a Igreja ensina sobre essa prática, destacando sua fundamentação bíblica, teológica e pastoral.

O que é exorcismo segundo a Igreja Católica?

De acordo com o Catecismo e o Ritual Romano, o exorcismo é uma oração solene realizada em nome de Cristo, pela qual a Igreja pede a libertação de uma pessoa ou objeto sob influência demoníaca. A Catholic Encyclopedia descreve-o como um “ato solene de adjuração” — ou seja, uma ordem feita com autoridade, em nome de Deus, para que o demônio abandone a pessoa ou o lugar onde atua.

Diferentemente de práticas supersticiosas ou mágicas, o exorcismo católico é um rito legítimo da Igreja, fundamentado na fé e na autoridade recebida de Cristo. Pe. René Laurentin ressalta que ele não é um sacramento – que confere a graça ex opere operato (expressão latina que significa “pelo próprio fato de ser realizado”), ou seja, que atua independentemente da disposição do ministro –, mas um sacramental, cuja eficácia está ligada à fé da Igreja e à disposição do sacerdote exorcista e do fiel. Essa forma de ação é chamada ex opere operantis, isto é, depende da colaboração e da fé daqueles que participam do rito.

Assim, o exorcismo é uma expressão da vitória de Cristo sobre o mal, sendo realizado de forma sóbria e controlada, longe de qualquer conotação espetacular ou sensacionalista.

Exorcismo menor e exorcismo maior

A Igreja distingue duas formas principais de exorcismo: o exorcismo menor e o exorcismo maior. O exorcismo menor está presente nos ritos do Batismo, e consiste em orações para fortalecer o catecúmeno contra as tentações e libertá-lo da influência do maligno, preparando-o para a vida nova em Cristo. Esse tipo de exorcismo também pode ser usado em bênçãos simples (casas, objetos) e em outros ritos de proteção previstos no apêndice do Ritual Romano.

Já o exorcismo maior, também chamado de solene, é destinado a casos de possessão demoníaca. Trata-se de um rito mais complexo e reservado, que só pode ser realizado por um sacerdote autorizado pelo bispo diocesano, conforme prevê o Código de Direito Canônico 2.

Ambos os exorcismos têm como finalidade manifestar a autoridade de Cristo sobre os espíritos malignos, mas diferem quanto à sua aplicação: o menor é preventivo e preparatório, enquanto o maior é um rito de libertação frente a uma possessão efetiva.

Que tal rezar o Pequeno Exorcismo de São Miguel Arcanjo, uma oração tradicional composta pelo Papa Leão XIII?

Fundamentação bíblica do exorcismo

A prática do exorcismo tem base sólida nas Escrituras. Nos Evangelhos, Jesus realiza diversos exorcismos como sinais de sua missão messiânica: em Cafarnaum, expulsa um espírito imundo 3; liberta o endemoniado geraseno 4, revelando a pluralidade demoníaca; cura um menino possuído que sofria convulsões 5 e liberta a filha da mulher cananeia à distância 6.

Além desses relatos, Pe. Laurentin destaca que os Evangelhos deixam evidente a distinção que Jesus faz entre possessão e enfermidades comuns, rejeitando reduções que explicam tais episódios apenas como curas médicas. Ele sublinha ainda o ensinamento de Cristo em Mc 9,29 — “Essa casta só pode ser expulsa com oração e jejum” — conectando-o ao contexto e evidenciando a dimensão espiritual profunda desse combate.

Por fim, Jesus transmite explicitamente aos apóstolos o poder de expulsar demônios 7 e, antes de ascender ao Céu, confirma que essa autoridade permaneceria na Igreja, como parte de sua missão: “Em meu nome expulsarão demônios” 8. Essa continuidade bíblica fundamenta o ministério exorcístico exercido de forma oficial pelos apóstolos e seus sucessores ao longo dos séculos.

O que a Igreja ensina sobre possessão e influência demoníaca?

A Igreja ensina que o demônio é uma realidade pessoal, não apenas um símbolo ou uma metáfora para o mal. Pe. Laurentin explica que ele é ao mesmo tempo ‘símbolo e realidade’: um anjo decaído que se opõe a Deus e busca afastar as pessoas d’Ele.

A Escritura também aponta para a pluralidade dos espíritos malignos, como se vê no episódio do geraseno, onde o possesso afirma ser habitado por muitos demônios — ‘Legião é o meu nome, porque somos muitos’ 9.

Essa realidade nos ajuda a compreender que a ação demoníaca pode se manifestar de diferentes formas: a tentação, que busca afastar a pessoa de Deus; a opressão e a obsessão, que envolvem ataques espirituais mais intensos; e a possessão, em que o maligno, de modo extraordinário, toma posse do corpo de uma pessoa (sem jamais dominar sua alma). O Ritual Romano e a experiência pastoral da Igreja reconhecem essas gradações, exigindo discernimento para identificar corretamente cada caso.

Saiba mais sobre o que a Igreja ensina a respeito dos seres espirituais, anjos e demônios.

Como distinguir ação demoníaca de doenças psíquicas?

A Igreja orienta que, antes de realizar um exorcismo maior, deve haver um criterioso discernimento, que inclui a consulta a profissionais de saúde, para descartar causas naturais ou psiquiátricas. Essa prudência, prevista no Ritual Romano e reforçada em instruções disciplinares da Igreja, evita que fenômenos psicológicos ou doenças sejam confundidos com possessão. O Pe. Laurentin adverte que “o demônio pode disfarçar-se por trás de sintomas físicos ou psíquicos”, 10 reiterando a necessidade de uma avaliação cuidadosa e multidisciplinar. 

Sinais que podem indicar a necessidade de exorcismo

O Ritual Romano lista alguns sinais clássicos que podem indicar a necessidade de um exorcismo maior. Entre eles estão: falar línguas desconhecidas ou compreender idiomas jamais estudados; revelar conhecimentos ocultos que a pessoa não poderia ter por meios naturais; manifestar força física desproporcional à sua condição; e demonstrar aversão intensa a símbolos e objetos sagrados 11. Esses sinais, contudo, não são provas absolutas, e por isso a Igreja orienta que sejam avaliados com extrema prudência antes de autorizar o rito.

Para isso, o exorcista deve conduzir entrevistas detalhadas com a pessoa, ouvir testemunhas, consultar profissionais de saúde e submeter o caso ao discernimento do bispo, que é o responsável último por conceder a autorização. Essa abordagem garante que o rito seja realizado apenas quando há certeza moral suficiente sobre a ação demoníaca, evitando interpretações precipitadas e preservando a integridade do ministério exorcístico.

Quem pode realizar um exorcismo?

O exorcismo maior é reservado exclusivamente a um sacerdote exorcista, ou seja, um presbítero designado pelo bispo diocesano e com autorização expressa para exercer esse ministério.

O Código de Direito Canônico dispõe: “Nenhum sacerdote pode legitimamente realizar exorcismos sobre os possuídos, a não ser que tenha obtido licença peculiar e expressa do Ordinário do lugar.”

Esse sacerdote deve ter sólida vida espiritual, prudência pastoral e preparo específico para lidar com casos de influência demoníaca, como orienta o Ritual Romano. Ainda sobre isso, Pe. Laurentin resume: “O exorcista deve possuir santidade e prudência, mas também dons de discernimento, de autoridade, de contato e de influência” 12. Além disso, as diretrizes da Congregação para a Doutrina da Fé 13 reforçam que essas permissões devem ser concedidas com grande cautela, e que o exorcismo não pode ser inserido na celebração da Santa Missa, dos sacramentos ou da Liturgia das Horas, mantendo-se sempre como um rito próprio e distinto.

O papel do bispo e a autorização eclesiástica

O bispo diocesano é a autoridade máxima em matéria de exorcismos dentro de sua diocese. A ele compete avaliar cada caso, discernir a necessidade do rito e conceder a licença específica para que um sacerdote possa realizá-lo. O Ritual Romano destaca que o exorcismo maior deve ser conduzido sob sua orientação, e a Congregação para a Doutrina da Fé reitera que essa autorização não deve ser concedida de forma automática, mas após uma análise cuidadosa, preservando a dignidade do rito e a segurança pastoral.

O exorcista oficial da diocese

O sacerdote exorcista, oficialmente designado pelo bispo, atua como ministro específico para este rito. Ele deve manter um vínculo estreito com o Ordinário, apresentando relatórios, recebendo orientações e agindo sempre em comunhão com a autoridade eclesial. Como lembra o Pe. Laurentin, “o exorcista não age por conta própria, mas como delegado da Igreja, unido ao seu bispo e ao corpo eclesial” 14. Essa relação garante que o ministério seja exercido com equilíbrio e obediência, evitando desvios pessoais e mantendo a integridade da missão.

Reze conosco a Novena ao Padre Pio, que lutou durante toda sua vida contra o demônio.

O Rito do Exorcismo: como é realizado

O Ritual Romano descreve que o exorcismo maior deve ser conduzido com sobriedade, evitando qualquer prática supersticiosa ou teatral. Segundo o Pe. Laurentin, “o rito coloca o possesso diante de Cristo, proclamando a Palavra que liberta e invocando a força da cruz, enquanto a Igreja intercede com perseverança até que se manifeste a vitória do Senhor” 15.

No decorrer do rito, o sacerdote exorcista recorre a sinais e gestos que expressam a autoridade da Igreja: a imposição das mãos sobre a pessoa, o uso da estola violeta como sinal do ministério ordenado, o crucifixo que recorda a vitória de Cristo sobre o mal e, quando oportuno, o uso de relíquias. Essa configuração preserva a essência do exorcismo tal como transmitida ao longo dos séculos. Embora costume acontecer em uma igreja ou capela, o rito pode ser realizado em outros locais apropriados, sempre com a presença de testemunhas idôneas e autorização do bispo.

Elementos do rito: oração, sacramentais e autoridade de Cristo

O exorcismo não é um ato mágico, mas uma súplica solene feita pela Igreja em nome de Cristo, cuja autoridade é a verdadeira força que expulsa o maligno. Mais do que gestos exteriores, trata-se de um encontro espiritual em que a Palavra de Deus, a oração e o uso dos sacramentais manifestam a presença salvífica de Cristo e a ação de sua graça. O Pe. Laurentin destaca que “a eficácia do exorcismo depende da fé autêntica e de uma vida de oração fortalecida pelo jejum, como ensinou Jesus: ‘Essa casta só pode ser expulsa com oração e jejum’” 16. Assim, o rito une a autoridade da Igreja ao esforço espiritual do fiel, exigindo tanto a intervenção do ministro quanto a disposição interior de quem busca libertação.

Outro sacramental que pode ser usado tanto no rito do exorcismo quanto na vida cotidiana dos fiéis leigos é a água benta.

O que a Igreja adverte sobre o exorcismo

A Igreja reforça que o exorcismo não é um espetáculo, mas um ato profundamente espiritual, que deve ser realizado com discrição e sob orientação segura. Ele exige prudência para evitar abusos ou distorções e precisa manter-se fiel ao que a Igreja prevê em sua doutrina, sem acréscimos supersticiosos ou desvios do seu objetivo principal: invocar, com a autoridade de Cristo, a libertação da pessoa ou do lugar oprimido pela presença e influência do maligno.

Perigos do esoterismo e “exorcismos” leigos

A Igreja também alerta para os riscos de práticas não autorizadas que se apresentam como exorcismos, mas que não têm vínculo com sua doutrina ou disciplina. O Pe. Laurentin denuncia a proliferação de “rituais paralelos”, afirmando que “multiplicam-se práticas improvisadas que nada têm de cristãs, conduzidas por curandeiros ou líderes religiosos sem mandato, e que misturam superstição, ocultismo e sincretismo” 17. Essas práticas não só são ineficazes espiritualmente, como expõem as pessoas a maiores perigos, especialmente quando associadas ao satanismo, ao espiritismo e à correntes ocultistas. 

Importância da vida sacramental como proteção

Além do exorcismo, a Igreja ensina que a principal proteção contra o mal está na vida cristã ordinária. A participação frequente na Eucaristia, a confissão regular, a oração pessoal e comunitária e a prática da caridade são meios eficazes para fortalecer o fiel contra as investidas do maligno. O Pe. Laurentin recorda que “o exorcismo não substitui a conversão e a vida sacramental, que são a verdadeira defesa do cristão contra o mal” 18. Dessa forma, a luta contra o demônio começa no cotidiano, com a vivência sincera da fé e a busca contínua pela graça de Deus.

Saiba como fazer uma boa confissão.

Exorcismo e a vida espiritual do fiel

O exorcismo, como rito particular da Igreja, expressa a missão de Cristo de libertar a humanidade do poder do maligno de forma plena e definitiva. Para os católicos, isso se traduz em viver a fé de modo concreto por meio da oração, da participação nos sacramentos e da confiança na providência divina. Como recorda o Evangelho: “Eis que vos dei poder para pisar serpentes e escorpiões e sobre toda a força do inimigo” 19. Essa autoridade, comunicada à Igreja, se manifesta especialmente nesse ministério.

O Pe. Laurentin resume essa realidade ao dizer que o exorcismo “não é um ato isolado, mas parte de um mapa espiritual que conduz à vitória final de Cristo sobre o mal” 20. Assim, esse rito deve ser compreendido como um recurso que a Igreja coloca a serviço do povo de Deus, sem ocupar o lugar central que pertence à vivência cotidiana da fé. É nessa caminhada cristã que se experimenta plenamente a vitória do Senhor, numa vida coerente com o Evangelho.

Já ouviu falar da Quaresma de São Miguel? Descubra o que é e como participar.

Referências

  1. n. 1673[]
  2. cân. 1172[]
  3. Mc 1,23-27[]
  4. Mc 5,1-20[]
  5. Mc 9,14-29[]
  6. Mt 15,21-28[]
  7. Mc 6,7; Lc 10,17[]
  8. Mc 16,17[]
  9. Mc 5,9[]
  10. Laurentin, p. 142[]
  11. cf. De Exorcismis et Supplicationibus Quibusdam, Praenotanda, n. 16[]
  12. Laurentin, p. 158[]
  13. Carta de 29 de setembro de 1985[]
  14. Laurentin, p. 160[]
  15. Laurentin, p. 152[]
  16. Laurentin, p. 149[]
  17. Laurentin, p. 163[]
  18. Laurentin, p. 170[]
  19. Lc 10,19[]
  20. Laurentin, p. 175[]

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